Ainda em nova Orleans, passo por vários bares, restaurantes e o fluxo constante de pessoas. Trabalhadores e donas de casa provavelmente seguindo para casa, só agora percebo olhando para os restaurantes lotados que já são quase onze horas, percebo rapidamente pelos uniformes sujos de graxa ou fuligem que na maioria são funcionários das fábricas. Vejo em seus semblantes um desprezo de suas próprias profissões e o aparente cansaço.
No entanto ainda me vem a imagem daquele padre.
Algo de muito errado está acontecendo mas não consigo distinguir o que é. A pergunta que tenho em mente não é quem está mentindo mas sim quem diz a verdade.
Próximo da saída que me leva até o rancho dos Hermound paro o carro e levanto os vidros, ascendo um cigarro e dou uma olhada para o céu novamente.
O tempo está mais estranho do que de costume, está carregado de nuvens porém sem sinal de chuva, pegar a estrada com esse tempo só um louco desesperado por respostas, pensando bem nunca me importei tanto com estradas de terra e tenho um objetivo a concluir.
Ligo meu carro novamente e confiro meu combustível, acho que é suficiente pra ir e voltar sem problemas. Acelero e entro naquela estrada, devo chegar lá em umas três horas.

No caminho vendo apenas as últimas casas e logo depois apenas pastos e árvores. Melhor eu organizar meus pensamentos.
O primeiro passo dessa manhã no caso da garota desaparecida foi o convento aonde madre superiora me escondeu muitas informações, na volta tenho que retornar lá, preciso ver o quarto e conferir se os documentos falam a verdade. A madre parecia bem mais irritada quando peguei o ficheiro, isso foi estranho, é como se ela não desapareceu com esse documento por alguma razão, talvez medo de desfazer de uma prova religiosa ou, talvez esse documento para ela fosse uma segurança,mas enfim isso descubro quando voltar.
O segundo foi a igreja, onde foi incomodo, assustador de certa forma e o padre não disse coisa com coisa de certa forma. O mais estranho é que a passagem bíblica que ele citou dizia sobre Caim e Abel, me lembro bem quando era pequeno e minha mãe me levava a igreja, não consigo me lembrar quem era o padre, mas, essa passagem se trata dos sacrifícios de Caim e Abel. Posso estar errado por não ser muito fiel a essas baboseiras católicas mas foi pouco antes de um matar o outro.
O que mais está me incomodando nisso tudo é que me pareceu que o padre Jacob estava tentando me dizer algo porém não diretamente.
Ele disse que a família era fiel a igreja, a quanto tempo e qual o motivo de deixarem de ser. Algo não está me cheirando bem, aquele maldito relógio não me deixou em paz um segundo.
A prova inicial relatando o caso parece ter sido bem avaliada, mas a segunda não faz sentido, olhos negros… Onde foi que eu vi isso…
A escrita estranha não me parece comum, uma criança não teria uma mente tão fértil, tenho que descobrir o que significa. Destrinchar tudo para distinguir o que é fato e o que é puro fanatismo.
Acreditar que em algum lugar existe alguém, uma entidade sem rosto, que ninguém nunca viu ou tem prova que existe, com poderes mágicos para curar e salvar pessoas?
Se existisse tal figura eu gostaria de ver fazendo realmente algo por nós além de assistir a podridão em que vivemos. Os crimes, assassinatos e essa vida medíocre que vejo todos os dias nos rostos dos velhos e o ódio existente entre os jovens, se tal coisa fosse real Alice não estaria como está.
Hoje não é meu dia de sorte, começou a chover, os pingos de chuva caem sobre a estrada de terra, diminuo a velocidade logo se formarão as poças de barro, falta apenas uma hora pra chegar.
Enfim vejo a porteira aberta com um arco em madeira escrito “Rancho Hermound”. Vou entrando devagar não quero assustar a família. Um caminho traçado em pedras irregulares me leva até a casa relativamente grande, vejo que eles possuem boa terra devido a plantação de milho, sigo adiante e estaciono diante da entrada da casa.

Uma boa casa a frente uma escada de no máximo quatro degraus, uma frente com corrimão de madeira e um bom espaço que imagino servir para se sentar e observar as terras devido a duas cadeiras posicionadas a frente. A casa tem dois andares exatamente como dito no relatório polícial, imagino que a janela do segundo andar, com a cortina fechada seja o quarto da criança, observando daqui não vejo forma de subir ou descer em segurança, continuo observando por um tempo de dentro do carro. Vejo a cortina se movimentar estranhamente já que a janela está fechada, observo mais atentamente procurando por alguma explicação.

A cortina se abre e nitidamente vejo uma mão pequeno bater no vidro, de dentro do carro ouço um grito agudo que vem de dentro da casa, que merda é essa.
Saco meu revólver e saio do carro correndo em direção a porta, coloco a mão na maçaneta e viro rapidamente e vejo que está destrancada. Abro e entro mirando o meu 38 procurando uma escada.
Entro rapidamente dizendo ser da polícia em alto e bom som, grito por Stacey e pelo senhor e senhora Hermound, vejo a escada para o segundo piso e subo rapidamente, minha respiração está ofegante, o passos duros nos degraus de madeira ecoam por toda a casa, chegando no segundo piso ouço o som de uma porta fechando com brutalidade. Que porra está acontecendo, meu coração está disparado, vejo a porta com o nome dela escrito em uma plaquinha. Vou de ombro direto na porta com a intenção de abrir a força caso algo tente impedir minha entrada, a porta se abre com força e bate na parede fazendo um grande estrondo, miro imediatamente na quarto a janela está aberta, algo abriu essa janela, vi com meus olhos que estava fechada antes, corro em direção a janela e aponto para fora.
Por uma fração de segundo tenho a impressão de ver uma pessoa pequena na frente do meu carro e tenho a nítida impressão de ouvir uma risada de criança seguida de passos, mas, desaparece assim que olho novamente.
Me viro imediatamente para porta por onde entrei, mas que porra está acontecendo aqui, estou ficando louco? Corro para conferir a casa aonde estão os país dela, olho o segundo andar inteiro, em todos os cômodos não há ninguém. Desço para o primeiro andar, caralho meu coração vai explodir nesse ritmo, confiro os cômodos e também estão vazios, volto para a sala de entrada e sobre uma lareira vejo um grande quadro que me deixam completamente arrepiado. Uma jovem de grandes cabelos negros, um rosto delicado, com olhos pequenos e sonolentos. Num piscar de olhos sinto como se olhasse diretamente para mim, eu só posso estar louco, isso não é possível, eu sonhei com Stacey?
O quadro cai, me deixando mais aflito que antes me aproximo lentamente, estou realmente assustado isso não pode ser real, olho atrás do quadro e vejo um símbolo parecido com um daqueles que estava na folha que o padre me entregou.
Saio da casa e sento na escada e observo o meu carro ainda incrédulo. Sinto que meu coração vai fugir pela boca, ainda estou ofegante.
Onde estão os Hermound? o que estava aqui? O que significam esses malditos símbolos?
Só conheço uma pessoa que pode me dar essas respostas, Robert J Flannagan, um estudioso de simbologia viciado em café e livros.
Vou usar o telefone deles e comunicar a agência sobre o ocorrido, pedir reforço pelo que me parece há mais dois desaparecidos.
Ligo e falo com Milles, ele me diz que vai falar com um amigo na delegacia para enviar alguns policiais, ele não parece muito feliz com a notícia. Pela primeira vez em anos ele me pergunta como estou, respondo que não tenho mais idade pra ficar correndo, ele me diz que talvez seja melhor passar o caso para outro, me nego a entregar, Milles nunca foi de se preocupar mas diz que vai marcar uma consulta com um médico, digo que vou aguardar os policiais e desligo.